26 de março de 2025

O mercado de depósitos: chave oculta do sistema financeiro

Expansão

Aurora Cuadros, Diretora Corporativa de Securities Services do Cecabank.

O bom funcionamento dos mercados financeiros assenta numa infraestrutura fundamental, muitas vezes invisível para o investidor final, mas fundamental para a estabilidade do sistema: a função de depositário. Embora o seu papel seja frequentemente ofuscado, os depositários desempenham um papel fundamental na segurança dos participantes, no cumprimento da regulamentação e na eficiência do mercado. Asseguram a guarda e o registo de ativos, protegem os investidores, supervisionam o cumprimento das normas por parte dos gestores e facilitam as transações e as liquidações nos mercados financeiros. Num ambiente cada vez mais sofisticado e regulamentado, o seu papel torna-se ainda mais estratégico.

O crescimento do setor do investimento coletivo em Espanha impulsionou o desenvolvimento do mercado de depositários. No final de 2024, os ativos dos organismos de investimento coletivo (OIC) atingiram 418.000 milhões de euros, mais 15% do que no ano anterior. Este crescimento reflete a crescente sofisticação do investidor espanhol e a progressiva transferência das poupanças dos produtos tradicionais para veículos com maior potencial de rentabilidade, como os fundos de investimento, os planos de pensões e as entidades de capital privado, entre outros. Ao mesmo tempo, as entidades depositárias registaram uma expansão semelhante, batendo recordes em termos de volume de ativos sob custódia.

As principais tendências do mercado, em particular, incluem um interesse crescente em investimentos alternativos, especialmente em participações privadas. Este tipo de veículo depositado registou um crescimento significativo, impulsionado pelas expetativas de rentabilidades mais elevadas em comparação com os mercados cotados, bem como pela diversificação e descorrelação que proporcionam. Além disso, estes veículos beneficiaram das transferências de património das SICAV, que foram prejudicadas pelas alterações fiscais introduzidas em 2021.

Para além destas tendências, o sector da gestão de ativos continua a crescer, impulsionado tanto pelo aumento das subscrições líquidas, graças ao bom trabalho realizado pelos gestores e profissionais de marketing, como pela recuperação dos mercados após a pandemia. Para além destes fatores conjunturais, existem outros fatores estruturais, como a evolução do comportamento dos poupadores, cada vez mais conscientes da necessidade de explorar alternativas aos depósitos e às contas à ordem.

No entanto, o crescimento do setor está longe dos níveis alcançados pelas principais plataformas europeias, como o Luxemburgo e a Irlanda, com ativos de 6 e 5 biliões de euros, respetivamente, e outros países relevantes, como a França e a Alemanha, que são seis vezes maiores do que o mercado espanhol. Esta singularidade do mercado espanhol deve-se sobretudo à menor presença de investidores institucionais - menos de 40%, contra mais de 70% na Zona Euro - e ao maior peso de soluções como a gestão discricionária de carteiras e os serviços de consultoria, que constituem os principais canais de acesso aos produtos por parte dos investidores finais, principalmente os pequenos investidores.

Potencial de desenvolvimento
É importante interpretar esta situação de uma forma positiva, uma vez que oferece um grande potencial para o desenvolvimento do mercado de depósitos. No entanto, este potencial é acompanhado de uma série de desafios. Por um lado, a integração de novas tecnologias, como a IA e a tecnologia de registo distribuído (DLT), pelas entidades depositárias, a fim de fornecer soluções inovadoras e valor diferencial aos clientes, bem como reforçar as capacidades de otimização dos processos e aumentar a eficiência.

Em segundo lugar, a adaptação à regulamentação. A investida regulamentar continua inabalável e as entidades depositárias estão a dedicar enormes quantidades de recursos a esta área. A harmonização regulamentar e a convergência da supervisão constituem um dos desafios que se colocam ao setor, a fim de garantir condições equitativas na prestação de serviços pelas entidades do setor da gestão de ativos e dos depositários. A este respeito, temos a oportunidade de ultrapassar uma das desvantagens competitivas sofridas pela indústria espanhola, relacionada com a regulamentação do empréstimo de valores mobiliários por instituições de investimento coletivo, cuja regulamentação está atualmente em curso.

Outro marco regulamentar no mercado de depositários é a plena implementação do Regulamento dos Mercados de Criptoativos (MiCA), que entrou em vigor a 30 de dezembro. Isto significará uma profunda transformação na atividade das entidades, que têm a oportunidade de começar a prestar serviços relacionados com criptoativos, trazendo níveis de confiança e qualidade aos seus clientes, comparáveis aos dos ativos tradicionais.

Por último, é de salientar a iniciativa europeia para aumentar a competitividade, com especial incidência na simplificação do quadro regulamentar. Parece que a Comissão Europeia tomou consciência do impacto da regulamentação sobre a competitividade, o que constitui um importante passo em frente. Neste sentido, seria aconselhável fazer uma pausa na criação de novos regulamentos para facilitar a sua análise e avaliação, refletir sobre os resultados obtidos e os efeitos gerados e racionalizar tanto os regulamentos existentes como o processo de elaboração de futuros regulamentos.

Embora haja ainda algum caminho a percorrer, o mercado de depósitos em Espanha tem um potencial de crescimento considerável, especialmente graças à incorporação de novas tecnologias e à diversificação dos produtos financeiros.

No futuro, o setor terá de superar os desafios regulamentares e aproveitar as oportunidades oferecidas pela transformação digital. Só assim a Espanha poderá consolidar a sua posição como um ator mais relevante no mercado europeu de depósitos.

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